quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Para além da rua


Ao olhar por uma janela vejo um jovem parado. Olhar vazio, concentrado, quase em outro mundo. Me vem em mente alguns pensamentos: onde ele realmente está? Algo normal ou patológico? Realmente uma coisa que não é comum. O mundo parado entre tantos movimentos. Ele, sem celular, sem esse mundo virtual. Passa os dias na rua, de um lado para o outro, sem falar, sem conversar com ninguém. Apenas olha, anda, contempla. Me vem um lapso de curiosidade. O que se passaria por essa cabeça? Como ele vê o mundo? Nossas relações geralmente são assim. As pessoas na ânsia da fala e do barulho não escutam, não contemplam. A rua é algo pequeno, pouco mais de duas encruzilhadas, que ele percorre e sempre na mesma direção. Muitos dizem que é louco, que não entende nada à sua volta. Tenho dificuldades com o conceito de loucura e de normalidade. Muitas vezes os que usam essas palavras as usam no sentido do senso comum, daquilo meramente que escutam e apenas repetem, sem ruminar o sentido, sem mesmo interiorizar as palavras. Me parece que são rótulos aparentes que, muitas vezes refletem uma sociedade doente e esquizofrênica que olha meramente o aparente e desconsidera o que está por trás. Em um exercício espiritual Jesus de Nazaré percebeu as nuanças da condição humana. Olhou para além de tudo isso. Cercou-se de homens e mulheres que, humano demasiados humanos, mesmo com limitações aparentes, pois não eram da classe formadora de opiniões, ou mesmo das cúpulas econômicas e religiosas, mas entendiam a essência da vida e percebiam na conduta e nas palavras dele que era alguém que olhava para cada um e, verdadeiramente, percebia a humanidade e o valor de cada pessoa. Em simples atos, desde uma visita em casa, a uma passada no trabalho, onde ele fosse fazia a diferença pois olhava cada um nos olhos e chamava pelo nome. Em uma sociedade de anônimos, como a nossa hoje, e mais ainda de indigentes sociais é escandaloso uma mensagem como essa. O grande escândalo é que sua mensagem é para o tempo presente, é para uma mudança aqui e agora e não algo para o suprassumo de uma vida pós morte. Mesmo em um tempo de profetas do caos, que pregam a desesperança e o fim, é preciso perceber que, os agentes da história somos nós. Cada um de nós. É preciso perceber e ir além daquilo que as aparências de um mundo caótico e materialista apresenta. Com as sandálias nos pés e com a enxada nas mãos ir e, a exemplo do semeador, fazer nossa parte. Mesmo sabendo dos riscos e das perdas que ocorrerão nesse trajeto para a plantação. O menino de olhos profundos e olhar vazio me inspirou a sair dessa rua e ir para além até mesmo desse bairro. Afinal, é uma grande cidade essa nossa existência. Shalom!

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Uma reflexão sobre o momento presente.


O pensamento é a maneira pela qual o homem se distingue dos animais na natureza. A priori seria isso uma grande vantagem nossa em relação aos animais. Contudo, em tempos de tanta superficialidade, egocentrismos e descartáveis as coisas tomam outros rumos. Em tempos virtuais as pessoas cada dia perdem mais suas identidades e se revestem com aquilo que queriam ser. Um a posteriori que só existe no universo de suas imaginações. Na modernidade líquida de Bauman, as coisas passam entre nossos dedos e tomam formar inimagináveis. Dos papiros aos e-mails quanta coisa mudou. Vivemos escravos do tempo e do trabalho. Substituímos pessoas por máquinas e nos escondemos por trás de visores e monitores. E teclados teclam sem sentimentos e transmitem apenas aquilo que quem está do outro lado espera como resposta. Com as instituições que sempre foram referenciais em crise como vamos sobreviver? Estado, Igreja, Escola, enfim, aqueles que discursavam e se apresentavam como verdadeiros avatares perderam a força de suas palavras. Hoje a mídia despeja informações e deformações vinte quatro horas por dia nas mentes das pessoas. Sem nenhuma neura com as teorias de conspiração e de dominação do mundo, mas tendo que falar: estão a serviço de quem? Vendem o que? Que avatares apresentam a sociedade como aqueles à serem seguidos? Em intervalos de anunciadores e banhos de sangue na hora do almoço, muitas vezes nos apresentam uma desesperança só, uma verdadeira barbárie. Até me pergunto: se houver mudança o que eles apresentariam nos telejornais? Até que ponto é real a indignação do apresentador? O que me assusta é que, boa parte das pessoas aceita e segue sem questionar, já desistindo e colocando que não há alternativas possíveis e que sempre será assim. Ora, as partir do momento que perco minhas esperanças desisto de mudar e consequentemente me acomodo e passo a ver normalidade em tudo. Normalidade essa quer é fundamental para manter as estruturas de poder opressor que hoje imperam em nossa sociedade. O trabalho ascético de desmistificar essas estruturas acaba quando nós (aí me coloco enquanto professor) aceitamos e colaboramos para que os outros aceitem também. É preciso reinventar os valores éticos e morais de nosso tempo. Atualizar aquilo que não tem mais fundamento e resinificar as novas realidades. Em sua essência eles ainda são os mesmos, no entanto os desafios atuais são outros. A experiência de vida faz a diferença quando queremos um mundo melhor e uma realidade melhor. Para além de orelhas de livros e jargões novos e sedutores precisamos ter lucidez e frieza quando falamos hoje na política brasileira, nas políticas educacionais, em desenvolvimento sustentável, em sociedade justa e digna. Para além da indústria do marketing, que produz verdadeiros salvadores da pátria, precisamos superar esses modismos. Cada um de nós é responsável pela engrenagem social que vivemos. Um Estado forte e democrático onde caibam todos não começa de cima para baixo, mas, de baixo para cima. São nas pequenas coisas que sabemos qual é o caráter de alguém. Se for o caminho vamos reaprender tudo, vamos começar de novo, da estaca zero. Tem jeito quando nós dermos um jeito, não jeitinho, não arrumadinho, não furando fila, ou recebendo favores e concessões, mas, tomando consciência que, como está não pode ficar e o destino está nas mãos de cada um de nós.  Coragem sempre!

terça-feira, 16 de maio de 2017

À caminho do alto.


          A vida realmente é uma caixa de surpresa. Estamos mudando o tempo todo. É impressionante o quanto as pessoas são capazes de mudar radicalmente. Será que somos ás circunstancias?  Lembro de Maquiavel quando fala que os meios independem dos fins. O que importa é alcançar os objetivos. A ideia do inconsciente coletivo de Jung é esclarecedora para nos ajudar à olhar o pensamento coletivo e como as pessoas historicamente colocam suas esperanças cegas e figuras emblemáticas. Contudo os bastidores revelam que tais seres não existem, que o poder os modifica a partir do momento que os tem.

         A natureza humana é mesmo curiosa. Algumas pessoas não conseguem sair da superficialidade. Ficam simplesmente na aparência e na beira do lago. Não conseguem ir mais a fundo. Tipicamente aqueles que ficam nas orelhas dos livros. Quando olho a natureza, plantas, árvores, o verde isso me reanima pois elas não são aparência, são o que são e se mostram como tais. As caminhadas no final de tarde me ajudam a renovar esse espírito.


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O I Seminário Municipal de Ensino Religioso é um Evento Realizado pela Prefeitura Municipal de Bayeux, atráves da Secretaria de Educação e a Coordenação de Ensino Religioso. Com apoio da Universidade Federal da Paraíba, nas Pessoas dos professores Lusival Barcellos e Eunice Simões e também com a perceria das Edições Paulinas, na pessoa do Professor Vanderlan (Gerente Geral). Tempo como publico alvo professores, supervisores e diretores, o evento que tem como tema Diversidade, Tolerância e Educação, busca fazer uma flexão sobre o papel do ensino religioso nas escolas, bem como sua contextualização na pós-modernidade. Desde a abertura, dia 04 às 19:00, onde iremos refletir sobre o papel da Educação na atualidade e os desafios, até a sexta, onde se falará das práticas em sala de aula, dos conteúdos, das bases epistemológicas, bem como o lugar do mesmo na escola pública. O evento contará com a presença do prefeito Dr. Expedito Pereira, grande incentivador e responsável direto pela implantação da disciplina no município, bem como dos vereadores, representates de confissões religiososas e da comunidade em geral. Sendo realizado no CEFOR(Centro de Formação de Professores - Av. Liberdade, próximo aos Correios), nos dias 04 e 05 do corrente mês, estão sendo esperados cem participantes. Esse evento faz parte do processo de Formação continuada dos Professores de Ensino Religioso.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Um pensamento agosto




Existir é de fato um grande desafio. Seja ele para nós mesmos, aceitar nossos limites, reconhecer nossa finitude superar conflitos. Quando tomamos consciência do que está a nossa volta acabamos experimentando um sentimento de alegria e ao mesmo tempo angústia. Aquilo que Kierkegaard chamava de desespero humano. Um sentimento de vazio onde tudo a nossa volta perde o sentido, onde nenhuma cor tem brilho e as pessoas conversam a nossa volta e nada faz sentido; onde o existir passa ser um pesar.
A grande aventura humana é de fato o conhecer a si mesmo. Pondé com o seu pessimismo me inspira a desesperança.  A de fato acreditar que não há um possível amanhã melhor e que, todos nós apenas representamos papéis e fingimos acreditar em dias melhores. Onde no fundo, o que cada um quer são o seu prazer e sua realização, lembro sua idéia do politicamente correto, que de fato eu não sou. Mesmo não sendo tão radical quando Pondé. Contudo o meu desencantamento é nítido: não acredito na gratuidade das coisas faz tempo. O outro de fato, concordo com Sartre, é o inferno. As academias estão cheias de estrelas que querem brilhar sozinhas, as igrejas estão cheias de hipócritas manipuladores, a política cheia de oportunistas e dissimulados. No entanto nunca fomos tão políticos e tão religiosos. Só nos faltaria canonizar algumas figuras emblemáticas. Contudo escrevo de uma tarde angustiante de agosto de um lugar qualquer para reclamar, como o homem que sai com a lanterna ao meio dia procurando o deus de Nietsche, onde ele está? Vocês o mataram: eu e vocês.
A grande sacada de Comte-Sponville, no seu célebre Bom dia Angústia, foi nos alertar que a morte não é simplesmente algo fora do comum, muito pelo contrário, ela faz parte de cada um de nós. Já começamos morrer no dia que nascemos. É uma realidade que está intrinsecamente conosco. Lembro que os alunos não gostam quando falamos em sala desse tema. É assustador imaginar que, com toda nossa complexidade, inteligência, arrogância, petulância, sejamos mortais. Penso que nos assusta imaginar que em um determinado momento não estaremos aqui.  Daí nosso interesse pelo assunto. Refletir isso é nos jogar no grande universo das questões humanas. Que cada um possa contruir seu presente a cada instante plantando suas sementes e podando suas árvores; sejamos semore construtores de pontes. Ousemos sempre pensar.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Religiosidade Popular: fenômeno, mística e o símbolo


Resumo:

Nosso trabalho busca refletir sobre alguns aspectos no que diz respeito à religiosidade popular, como ela se estrutura sua relação com a instituição e o “resignificado” que ela recebe do povo. Tomando como elemento importante a questão do “fenômeno”, suas particularidades, além da questão simbólica que o mesmo envolve. Sendo o homem um ser aberto ao sagrado ele faz de sua realidade social algo presente nessa realidade, bem como a mística, que é essencial, acaba que, envolvendo toda essa relação.

 

Summary


Our work aims to reflect on some aspects regarding the popular religiosity, as it structures its relationship with the institution and "resignificado" she receives from people. Taking as an important issue of the "phenomenon", its peculiarities, beyond the symbolic issue that it involves. Since man is a being open to the sacred he does something this social reality in this reality and mysticism, which is essentially just that, involving all this respect

Palavras-chave: Religiosidade Popular, Fenômeno, Símbolo e Mística.

Keywords: Popular Religiosity, Phenomenon, Symbol and Mystic.

 

Introdução

 

            A principio é importante destacar que existe uma tendência a um continuísmo por parte dos historiadores quando o assunto é religiosidade popular, bem como um etnocentrismo que coloca em questão tais práticas não como religião e sim como religiosidade popular. Com isso corremos o risco de um reducionismo do fenômeno religioso, quando fazemos essa análise da religião em relação às conjunturas sociais. Quando falamos dessa forma estamos reduzindo a religião a simplesmente a sua dimensão institucional e com isso estamos privando-a de seu caráter fenomenológico[1].

O popular é aquele, não ordenado, não funcionário do sagrado, mas que vive intensamente as ideias religiosas e com isso, torna suas práticas comuns no meio da comunidade. Ele não precisa de autorização ou mesmo de uma insígnia para que sua autoridade seja reconhecida perante sua comunidade. E visto nessa prática seu valor utilitário e prático. Existe uma prestação de serviços locais que integram essas práticas a vida do povo. Seu imaginário parte da premissa que existe um criador de tudo e todos e que a existência é em função de alguma coisa, ou seja, que ela faz sentido. Além de nomear as coisas ás tornam sacras, bem como o incrível passa a ser possível em uma determinada ordem de valores e elementos místicos.

A religião popular permite que o povo expresse sua interioridade em gestos coletivos, rituais espontâneos que fazem com que o povo se expresse sua criatividade. Não é algo limitado ou mesmo enquadrado em “cânones ou liturgias” [2]. Essa religião rompe com as ideologias dominantes das estruturas sociais na medida em que tira o povo do anonimato, suas liturgias são em função de resignificações próprias e não para justificar ordens estabelecidas. Como a mesma não está sob o controle da igreja oficial, mesmo tendo sua essência teológica, faz com que o povo seja protagonista de sua própria fé. O povo, por meio de símbolos, acaba resignificando todo um arcabouço de ideias. Isso significa dizer que, em essência, a religião transcende as realidades puramente aparentes e palpáveis, em outras palavras:

“E isso vem exemplificar, mais uma vez, quanto à primeira perspectiva se fundamenta em uma – constrói seu objeto, a religião, enquanto – essência não falsificável, na medida em que a segunda se verifica, exatamente, em uma constante falsificabiliadede seu objeto (a religião).” (AGNOLIN, 2012, p.190).

 

A religião acaba trazendo para si uma responsabilidade ética e moral. Ela faz com que, homens e mulheres, adotem padrões comportamentais, de acordo com seus ditames bem como fomenta uma “relação pessoal” do homem como o sagrado, ou mesmo faz com que o mesmo passe a ter uma sensibilidade para o metafísico. A ideia de mística se dá nesse contexto: a relação do homem com esse “princípio metafísico”. Diríamos que o itinerário espiritual dele é a mística[3]. É esse aspecto que faz a diferença e reafirma o seu pertencimento, não há uma religião, mas sim a uma crença. Nas palavras de Faustino Teixeira:

“As tradições religiosas encontram, certamente, na mística a sua dimensão de gratuidade e de provocação permanente à abertura. Os místicos são aqueles que conseguem captar a dimensão de profundidade presente na vida e reconhecer o outro lado das coisas. Em razão de sua experiência de proximidade ao mistério, consegue com facilidade mover-se e comungar para além das fronteiras de sua inserção particular.” (TEIXEIRA, 2004, p.27).

 

                Não há necessariamente uma relação direta com a instituição. Esses personagens fazem a ponte entre as pessoas e o sagrado através de sua experiência própria, daí ele mesmo ser um símbolo vivo da mensagem que anuncia. Vamos entender símbolo aqui como a união entre duas coisas: o visível – mundo dos sentidos, e o invisível, aquilo que seria metafísico.

            Isso para dizer que a religião dá conta de todas essas realidades: seja da essência da coisa em si, de como ela se manifesta, onde percebo sinais dela, bem como daqueles que são “portadores” vivos dessa realidade que só percebo por minha intuição ou mesmo por alguma faculdade intelectiva.

O Fenômeno

 

            Todos os povos tem uma experiência religiosa ou tiveram. Essa experiência é a manifestação interna que é colocada em evidencia na sociedade, seja por uma prática de conduta seja por expressões culturais: seja por meio do símbolo, seja por meio da linguagem. Isso significa dizer que, são experiências humanas.

“Como toda experiência humana, ela também tende à comunicação e à socialização. Precisa ‘ser dita’; daí tantos caminhos para realiza-la.

O itinerário desde a experiência do sagrado até sua manifestação múltipla é o que faz o homureligiosus; o inverso, que parte das expressões religiosas e vai até sua intensão e origem, é o caminho feito pelo estudioso. Daí o nome de ‘fenomenologia da religião’, essa classe de análise que vai dos testemunhos (os fenômenos) até sua fonte geradora.” (CROATTO, 2010, p.9).

 

            Situar o fenômeno dentro da religião e fora dela, é ter a certeza de que ele é parte integrante da própria condição humana. Ele é o que está para além das aparências e das normas estabelecidas. É algo que está para além das formalidades e das convenções. Para que isso ocorra é necessário entender que a religião tem um caráter social e global, bem como real e significativo na sociedade. É aglutinadora e ao mesmo tempo separatista. Varia de acordo com a realidade social onde se apresenta e sua linha teológica[4]. Esse aspecto – do fenômeno – não vai bem em nossos dias, consequência do pragmatismo de nossa sociedade, bem como do esvaziamento, o objeto religioso perde seu valor.

 

“Ao meu ver, a Fenomenologia da Religião está em crise graças à hipertrofia interpretativa que está na base de sua implosão teórica, e sobretudo  por sua obstinada recusa ao processo de falsificação, o que provocou seu esvaziamento. Como foi acenado no início, de um lado, a explosão social e política das grandes religiões esvaziou o objeto religioso, a sacralidade no seu valor originário.” (PASSOS, USARSKI, 2013.p. 95)

 

            Reconhecer esse aspecto é, sobretudo, afirmar sua existência e importância em toda constituição religiosa. Aspecto esse tão bem apreendido pela religiosidade popular, que reconhece nele sua legitimidade para crer e reconhecer sua dimensão mística e real. Indo na contra mão dos sistemas institucionais o homem reconhecer no fenômeno suas motivações para afirmar suas crenças diante de tudo e todos.

A mística

 

            Tudo aquilo que percebo do fenômeno e consigo reproduzir em minha vida, pode ser considerado como mística. Quando consigo perceber atributos e percebendo-os sou capaz de resignificá-los ou mesmo de reproduzi-los isso já pode ser considerado mística. Levando os outros a terem uma “experiência” com o fenômeno sou capaz por esse meio de aproximar duas realidades, a saber, a visível e a invisível. Tornando o homem, por tal experiência, desapegado – ou mesmo desinteressado – das realidades materiais, pra não dizer, mundanas.

“Em síntese, a experiência mística provoca necessariamente um aprofundamento de si, um despojamento e desapego que impulsionam o sujeito para a dinâmica da alteridade. Não é fácil atingir tal desapego. Trata-se de um processo lento, complexo e permanente, que faz brotar uma atitude de total abertura.” (TEIXEIRA, 2004, p.30).

 

            Algumas figuras importantes podem ser citadas como exemplos de místicos que, com sua prática de vida foram influenciadores de movimentos, bem como de expressões da religiosidade popular, aja vista um Antônio Conselheiro no Sertão baiano, foi capaz de arrebanhar milhares em torno de seu “Arraial de Belo Monte” e com um “devocionismo” e uma releitura de práticas católicas, ser exemplo de liderança e de homem místico que, à frente de um movimento tipicamente messiânico, trazia esperança e a promessa de um mundo melhor para aquele povo sofrido e castigado por uma situação de miséria e seca. É a sua experiência pessoal que alimenta o movimento e se irradia para construir um novo momento para aquele povo. Quando o Arraial é construído ergue-se primeiro a Igreja e o Cemitério. As práticas das rezas eram constantes e a devoção a virgem Maria era diária com a recitação do terço em comunidade. Sua mística, vai no sentido contrário da instituição, que inclusive condena o movimento, mas é esse sentimento – mística – e o carisma do líder, que faz com que cause tanto “transtorno e incomode” o Estado e a Igreja, ao ponto de anularem o mesmo de forma trágica e sem piedade. Como ele poderíamos enumerar vários outros: São João da Cruz, Santa Terezinha, Padre Cícero, Frei Damião, entre outros, que, nos ajudam a refletir sobre o papel e a diferença que esses homens e mulheres, imbuídos de um “espirito reformador” e com características místicas alimentaram e alimentam o sentimento de uma religiosidade popular e um devocionismo no meio do povo.

                                                          

O Símbolo

            Podemos dizer que o símbolo é a linguagem formal que expressa o sagrado, é uma representação visível de algo que não posso ver. É a linguagem fundante da religião, é por meio dele que a “transcendência” pode ser percebida em sua forma palpável, visível.

“Por sua etimologia (do grego sum-ballo, ou sympballo), o símbolo refere-se a união de duas coisas. Era um costume grego que, ao se fazer um contrato, fosse quebrado em duas partes de um objeto de cerâmica, então cada pessoa levava um dos pedaços. Uma reclamação posterior ela legitimada pela reconstrução (“pôr junto” = symballo) da cerâmica destruída, cujas metades deveriam coincidir. A união das partes permitia reconhecer que a amizade permanecia intacta.” (CROTTO, 2010, 84-85).

 

                É a ideia que o símbolo une duas realidades separadas que, ao mesmo tempo se completam e fazem parte de uma mesma estrutura fenomenológica. Por si só ele é capaz de conduzir o homem a uma experiência que foge do cotidiano. Faz com que ele possa vivenciar as várias categorias hierofânicas[5] do sagrado. O símbolo religioso pode ser tido como uma forma de experiência da realidade, ou seja, ele, de certa forma sacraliza o que está a sua volta dando-lhe um sentido supra-natural. Ele acrescenta um novo valor. Pode ser algo concreto: uma imagem de um santo, um amuleto, um local sagrado (santuário de peregrinação), como um ritual (benzer um objeto, as novenas marianas no interior[6], onde sem clérigos o povo reza e manifesta sua fé), enfim, o símbolo dá o que falar.

“[...] teríamos que repetir que o mundo da religião é o mundo do símbolo. O homem religioso percebe a ‘fala’ ou a ‘revelação’ do mistério da realidade por meio de símbolos. A realidade em sua profundidade, não se manifesta em linguagem direta”. (MARDONES, 2006, p.89).

 

            É um momento significativo quando alguém, imbuído de um sentimento religioso reproduzir todo um sistema simbólico em seu cotidiano e é influenciado pelo mesmo. Isso remete o papel fundante do símbolo, quando ele acaba assumindo uma função social, na medida em que interfere e modifica a própria realidade.

           

Considerações finais

            A religiosidade popular, mesmo que passando por uma crise fenomenológica, tem se mostrado firme e cada dia mais presente em nossa sociedade. Com todos os hibridismos ela vem sobrevivendo e resignificando cada dia mais os processos que envolvem o sagrado: rito, símbolo, mística, enfim, todas as categorias hermenêuticas que a justificam ou mesmo que as alimentam. É importante destacar que, no aspecto de sua fenomenologia a religiosidade popular se distancia dos aspectos institucionais, pois sua essência é percebida pela capacidade de abstração do indivíduo e sua consciência e relação com aquilo que ele acredita ser “o sagrado”. O nosso povo brasileiro, herdeiro de uma miscigenação étnica e cultural, acaba por absorver e reproduzi elementos oriundos dessa herança. Daí uma propensa inclinação para o desenvolvimento de um cenário ideal para a “religiosidade popular”.

Elementos dessa religiosidade, como a mística, são fundamentais para que essas manifestações não acabem. Quando o povo, por meio de líderes, ou mesmo pessoas que se destacam por um “pietismo” ou por uma conduta que é identificada como “santa” (só pra lembrar a figura dos beatos) encontram nesses exemplos elementos necessários para serem reproduzidos e resignificados. Fazendo com que sejam passadas à diante essas práticas. Esse sentimento de simplicidade, que a mística somada ao símbolo conduz o “homem simples” a uma vivência de da experiência religiosa em sua plena transcendência. Bem como sua abertura para o sendo do mistério.

 

 

Bibliografia:

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia, São Paulo: Martins Fontes, 1992.

AGNOLIN, Adone. História das Religiões: Perspectivas histórico-comparativa, São Paulo: Paulinas, 2013.

CROATTO, José Severino. As Linguagens da Experiência Religiosa: Uma introdução à fenomenologia da religião, São Paulo: Paulinas, 2010.

MARDONES, José Maria. A vida dos Símbolos: A dimensão simbólica da religião, São Paulo: Paulinas, 2006.

REALE, Giovanne. História da Filosofia, Volume V. São Paulo: Loyola, 1999.

STEIL, Carlos Alberto. O Sertão das Romarias: um estudo antropológico sobre o santuário de Bom Jesus da Lapa – Bahia, Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1996.

TEIXEIRA, Faustino. Meneses, Renata (Orgs.) As Religiões do Brasil: continuidades e rupturas, Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2006.

TEIXEIRA, Faustino. Meneses, Renata (Orgs.). Catolicismo Plural: Dinâmicas Contemporâneas, Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2009.

TEIXEIRA, Faustino.No Limiar do Mistério – Mística e Religião, São Paulo: Paulinas, 2004.

PASSOS, João Décio; USARSKI, Frank (Org.). Compêndio de Ciência das Religiões, São Paulo: Paulinas: Paulus, 2013.

 

 

 

 

 

 



[1]Estamos aqui usando o termo fenomenologia como foi utilizado por Hussel em Investigações Lógicas (1900-1901) onde ele fala da fenomenologia tratando da essência como uma categoria hermenêutica de um “objeto real”. Ou seja, quando falo do caráter fenomenológico da religião me refiro àessência de suas manifestações.
[2]O que não significa que ela é feita de todo jeito, quando falamos que não segue um Cânone ou liturgia estamos falando dos moldes oficiais da Igreja romana.
[3] Aqui entendemos esse termo como é destacado por Reale:“O termo deriva de mystikós, que significa o que está em conexão com os mistérios. Só na antiguidade tardia, porém, aparece a expressão mystiképarádosis, para indicar a doutrina mística, que mostra ao homem como destacar-se do sensível e alcançar o Absoluto, até assimilar-se e unir-se a Ele”.
[4] Não quero com isso dizer que ela tem um caráter flexível por demais ou mesmo que não tenha uma identidade própria. Contudo é importante destacar que a religião e mais especificamente, sua manifestação popular, é algo que vai tomando forma e fazendo seus hibridismos de acordo com cada época e lugar.
[5]Aqui uso o sentido da palavra como “manifestação do sagrado” (revelação).
[6] No mês de maio é “tradição” as novenas rezadas nas casas pelas próprias pessoas sem a presença do clero. Expressa a fé e a religiosidade popular que une as pessoas e garante a transmissão desse costume. Cada noite o alta é ornado com flores e as flores murchas de todas as noites são queimadas em uma fogueira na última noite do mês, noite esse que ocorre uma “coroação simbólica” da imagem de Maria mãe de Jesus Cristo (Nossa senhora Imaculada Conceição).

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Por uma escola que eduque: uma discussão entre prática pedagógica e realidade social.





            Mais que nunca podemos afirmar que a escola é o lugar por excelência das competências educacionais. Não só um lugar para se “repetir” conhecimento, lugar para transmissão de dados ela precisa ser o lugar da práxis social, ou seja, ela deve ser uma agente transformadora da realidade onde ela está inserida. Isso significa dizer que não se pode pensar uma escola hoje dissociada de sua realidade social, fora de sua comunidade.
            Muito embora tenhamos politicas públicas federais direcionadas e orientadas para determinadas finalidades, as mesmas – aqui me refiro especificamente ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) - como sendo um mecanismo de redistribuição de recursos vinculados à educação no país, que é um plano maior de uma realidade diversificada de acordo com cada realidade regional. Isso significa que, independente de recursos ou números não dá para imaginar uma educação sem pensar as diferenças de cada localidade, a comunidade no entorno da escola.
            Daí a necessidade de cada escola ter seu Projeto Político Pedagógico (PPP), como sendo um recurso mediador entre escola e “comunidade escolar”. Ele é responsável por apresentar o perfil da realidade escolar e planejar as ações dentro e fora da escola. Ignorar isso é não ter compromisso com a educação e principalmente com o aluno enquanto pessoa humana. Isso é simplesmente instrumentalizar um processo que é por natureza, dinâmico.
            Tomando como instrumento de análise a educação pública, podemos afirmar que, desde 2007, com o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), foi se colocado instrumentos eficazes para avaliação e de implementação de politicas de melhorias na educação, sobretudo na educação básica que é o inicio de todo processo. Esse mesmo programa cria uma estratégia que é o Plano de Metas que busca melhorar os índices da educação. A partir disso os municípios aderem a um Plano de Ações Articuladas (PAR) que tem como principio a transparência nos dados da educação de cada município para que todos possam ter acesso e acompanhar como cada um planeja e executa suas ações.
             Mesmo com dificuldades e aqueles que não creem que a educação pode mudar o mundo acreditamos que, com esses mecanismos teóricos podemos construir uma prática diferente e de resultados. Uma educação que veja o homem em sua totalidade e não apenas como uma “peça de engrenagem”, ou mesmo um “simples sujeito histórico”. A sociedade mudará quando cada um tiver ciência do seu papel concreto, ai passaremos de utopias a uma realidade onde homens e mulheres de boa vontade sejam de fato cidadãos.


terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Um olhar crítico: O pensamento de Marx acerca da religião.



Um olhar crítico: O pensamento de Marx acerca da religião.
                                                                                                          Robertino Lopes[1]
            RESUMO
Este artigo propõe alguns pontos do pensamento de Karl Marx acerca da religião. Ao analisarmos o contexto em que ele se apresenta procuramos discutir os conceitos que Marx propõe, seja ele de alienação, seja de ideologia e suas implicações na temática da religião. Ele apresenta a justificativa para condenar a religião, pois a mesma é instrumento de controle social e de truncamento do potencial humano. Como Marx não escreveu, nem estudou especificamente religião partimos de fragmentos de textos, bem como de autores (Urbano Zilles e Ivo Lesbaupin), para desenvolver essa reflexão.
Palavras-chave: religião – alienação – dialética – ideologia.

Filósofo, economista e cientista político alemão, Marx nasceu em Tréveros em 15 de maio de 1818, cidade capital da província do Reno, cuja tradição remota os tempos de Roma. Filho de classe média, o pai advogado, a mãe, uma judia dedicada à família. Sofre influência desde cedo do universo judaico, devido ao seu radicalismo, foi expulso de vários países europeus. O pensamento marxista exerceu profundas influências nas mais diversas áreas ligadas ao conhecimento humano: Filosofia, Sociologia, Economia e Educação.
O jovem Marx, depois de estudar direito um ano em Bonn (1835), foi a Berlin e ai se integrou ao clube dos doutores da esquerda hegeliana (David Strauss, Bruno Bauer, Hess e Max Stirner), influencia essa que o faz se tornar ateu. Como afirma Zilles: “A doutrina de Karl Marx nasce, no século XIX, da confluência do materialismo da ciência natural com o socialismo francês, penetrada e animada pelo espírito da dialética de Hegel”. A grande contribuição de Hegel para Marx vai ser o resgate da dimensão da Temporalidade e da Historicidade, em outras palavras, a perspectiva dialética do pensamento filosófico, que não vê no real algo pronto ou mesmo acabado, pelo contrário, enxerga que estamos diante de um “vir a ser”, de um movimento para frente, de um constante “devir”, como diria Heráclito de Éfeso. Marx coloca a dialética hegeliana com os pés na realidade.[2]
É preciso destacar que, inicialmente, que ele não se preocupou, ou mesmo se ocupou vastamente da temática ligada à religião. Ela se mostra presente nos primeiros anos de sua atividade intelectual e depois vai aparecer sobre formas de afirmações esporádicas em suas obras, para dizer melhor, não há nele uma preocupação específica em dedicar uma obra completa a essa temática. Ele, mesmo priorizando outras questões, deu certa relevância a esse aspecto.
Lênin, continuador da ideologia marxista e fundador do partido diz: “A teoria de Marx é o verdadeiro herdeiro  do que de melhor produziu a humanidade no século XIX, na forma da Filosofia alemã, da economia política inglesa e do socialismo francês”. Marx teria conseguido passar de uma realidade puramente teórica para o momento da práxis, esse salto só foi possível por sua compreensão do pensamento hegeliano, pensamento esse que vai influenciar direta e indiretamente toda sua obra.
Ao falar de marxismo e religião é preciso, antes de tudo distinguir o que a tradição vulgarizada do marxismo nos transmitiu e o que efetivamente Marx e Engels pensaram sobre a religião. Essa tradição não nos transmitiu apenas uma teoria, um conjunto de idéias – resumidas na afirmação “a religião é o ópio do povo” – mas uma história de oposições (Lesbaupin, 2011).
Marx era ateu muito antes de ser comunista. Sua atitude anticapitalista não foi pressuposto, mas confirmação. Aceitara o ateísmo da esquerda hegeliana de Berlin e Feuerbach. A inteligência de Marx conseguiu que o ateísmo se tornasse o fundamento e a ideologia para o socialismo até os nossos dias. Diz Zilles, citando os manuscritos econômico-filosóficos de Paris: “O ateísmo é o humanismo pela superação da religião, e o comunismo é o humanismo pela superação da propriedade privada”. Sua passagem por Paris, o contato com as idéias socialistas, com a miséria do proletário industrial, embora o mesmo nunca ter sido operário, fez com que se torna-se socialista e comunista. Passa a pensar na possibilidade de uma organização por parte dos trabalhadores e torna-se “o teórico do proletariado” (Zilles, 1991). Para Marx o ateísmo é algo bem claro, tão claro que não precisa de nenhuma investigação mais apurada de sua parte. Deus não passa de uma projeção do homem, por isso que a religião não passa de produção e alienação do homem, Berg diria que ela (a religião) seria uma legitimadora das questões humanas, logo, manipulável. “A religião serve, assim, para manter a realidade daquele mundo socialmente construído no qual os homens existem nas suas vidas cotidianas”. (Berg, 1985).
O homem é o criador da religião, ao propor uma análise da religião, Marx quer verificar os conflitos oriundos da mesma, sua superação e conseqüentemente ele quer destruir tais conflitos. A religião é o sentimento de paz e harmonia de uma sociedade alienada. É um momento necessário de um mundo alienado porque o justifica, o legitima (Berg). Seu protesto contra esse mundo permanece sem conseqüências porque propõe uma solução para além da história, para além-túmulo. A religião apenas oferece a libertação espiritual do homem, a libertação imaginária e ilusória, meramente aparente e abstrata. Somente a práxis revolucionária, o exercício dialético-histórico, será capaz de emancipar plenamente o proletário industrial, dispensando o protesto e o consolo da religião.
Na primeira fase, portanto, Marx trabalha a religião como alienação. Numa segunda fase, que começa com a Ideologia Alemã (1845) – onde se firma os princípios teóricos que serão o fundamento de sua produção intelectual – Marx considera a religião como ideologia. Na Ideologia alemã, Marx e Engels situam suas idéias como não tendo autonomia própria, como produto da atividade material do homem. A formação das idéias sejam elas filosóficas, morais, religiosas ou outras, se explicam a partir da maneira como os homens produzem os bens materiais (Lesbauspin, 2011).
Marx entende que a religião é uma consciência equivocada, errada em relação ao mundo. Enquanto protesto contra as situações humanas é protesto ineficiente, falho,  porque desvia atenção desse mundo e de sua transformação para outro, para o além, algo que, diante mão, não me dá nenhuma garantia, firmeza ou mesmo certeza concreta, que só posso abstrair ou mesmo nominar pela fé, por sentimentos, ou seja, não é algo confiável pelo viés da razão, ou mesmo da práxis-histórica.
Dessa maneira a religião age como calmante: “É o ópio do povo”. A religião retira a capacidade humana de ver a realidade, ela hipnotiza os homens com falsa superação da miséria, com falsas imagens e assim destrói sua força de revolta; revolta essa que poderia levar o homem a uma superação dessa realidade, em outras palavras, a religião anula todas as possibilidades, todas as tentativas do homem mudar, superar, transpor todas as barreiras impostas pelo capitalismo a sua existência. Para Marx o homem deve entender o processo histórico e superá-lo e isso só acontece na medida em que o homem sai do plano teórico para a práxis, ou seja, não é só entender é também superar, a religião seria o entrave nesse processo, tornado o homem passivo em todo esse contexto, daí sua condição alienante. Para ele não há uma ordem natural das coisas, tudo pode ser transformado.
A crítica de Marx é erguida e sustentada sobre o eixo das alienações nas suas mais diversas formas de manifestação. Por alienação ele tem um entendimento diferente de Hegel no sentido de exteriorização, mas um caráter pejorativo, histórico ou real. Trata-se de situações em que o homem se perdeu a si mesmo. Distingue a alienação religiosa, a alienação política, a alienação social, a alienação econômica e a alienação filosófica.
Na alienação religiosa, o homem projeta segundo Marx, para fora de si, de maneira vã e inútil, seu ser essencial, que faz com que ele não veja a realidade (ou veja de forma deformada) e perde-se na ilusão de um mundo transcendente, mundo esse que seria bem melhor que o atual, digamos que seria um mundo quer seguiria outra lógica, havendo compensações em relação a esse, dando ao homem uma esperança que só seria possível nesse mundo transcendente. Aceita, pois, o conceito feuerbachiano de alienação. A religião nada mais é que a projeção do ser do homem em um mundo ilusório. Com ela aliena-se a si mesmo, em outras palavras: “A religião é então reflexo ilusório, fantástico, das relações de dominação de classe, de exploração: as idéias religiosas exprimem, justificam e escondem a realidade da dominação. A religião é ideologia, falsa consciência”. (Lesbauspin, 2011). É a idéia que a religião não tem substância própria.
A religião faz o sujeito predicado, alcançando Deus sobre as nuvens, em vez de dar-se conta de que o céu está sobre a terra. Enquanto Feuerbach se contentara em denunciar intelectualmente a alienação religiosa, sem indagar as causas, Marx admite que a religião é uma ilusão, não, porém, ilusão puramente intelectual. A alienação religiosa deve ser analisada, compreendida e até refutada a partir da situação histórico-social concreta. Mas a religião é a expressão mais vivas da alienação do homem e não seu fundamento. A essência da alienação do homem encontra-se no contexto econômico, do tipo de relações de produção geradas no mundo capitalista, contexto esse que a religião aceita passivamente. Essa relação de produção reduz o homem a um estado de engrenagem, de mera peça; tirando do homem sua essência pensante e transformadora: “Destruindo essa estrutura econômica também se destrói a religião que é o seu produto. São as estruturas econômicas que, segundo ele, geram falsa consciência, que é a religião. Assim a idéia de Deus é resultado de uma economia alienante” (Lesbaupin, 2011).
A religião é o aroma de uma sociedade alienada. É um momento necessário de um mundo alienado porque o justifica. Seu protesto contra esse mundo permanece sem conseqüências porque propõe uma solução para além da história. A religião apenas oferece a libertação espiritual do homem, a libertação imaginária e ilusória. Somente a práxis revolucionária será capaz de emancipar radicalmente o proletário industrial, dispensando o protesto e o consolo da religião.
É uma forma da existência humana intrinsecamente falsa. A religião nasce segundo Marx, da convivência social e política perturbada dos homens, de lacunas deixadas pela própria condição humana. O crente suspira uma felicidade ilusória para esquecer sua desgraça presente, para com isso ignorar a realidade prática e histórica, significa dizer que seu olhar está difuso, pois não enxerga o que está diante dos próprios olhos. Por isso a religião é o ópio do povo, na medida em que ela contribui para que essa distorção na visão que ele tem de si e do que está a sua volta. Para libertar o proletariado e a humanidade da miséria, é preciso destruir o mundo que gera a religião.
Na da história da humanidade são as forças da natureza, depois surgem às forças sociais e, conseqüentemente, todo um arcabouço de situações, idéias, conceitos, enfim, a cultura. A seguir todos os atributos naturais e sociais dos muitos deuses são vinculados a um único Deus onipotente, reflexo do homem abstrato. No mundo da economia burguesa diz-se: “O homem pensa e Deus ajuda”. Para Marx, Deus é apenas consolação interesseira, justificação ilegítima para coisas legítimas. Segundo Marx, a religião não terá mais razão de ser quando a vida social aparecer como “obra de homens livremente associados, agindo conscientemente e mestre de seu próprio movimento social” (MARX. O Capital, 1965).
A crítica de Marx deve ser entendida num primeiro momento, como uma crítica ideológica ao cristianismo burguês de sua época, a sua ideologia e a instrumentalização da mesma. Para ele isso afetaria diretamente as relações de produção, logo, era mais um instrumento de alienação e escravidão do proletário. Ele analisa a função da religião na sociedade do século XIX, seu interesse era pelo papel que a mesma ocupada, ele nunca estudou sistematicamente a religião. “Na síntese hegeliana, o cristianismo deixa de ser religião para ser apenas cultura. Desta síntese origina-se, de um lado a solução social de Feuerbach e Marx como humanismos absolutos e, de outro, a solução religiosa que rompe com o mundo e a sociedade.  















BIBLIOGRAFIA

BERGER, Peter. O Dossel Sagrado – Elementos para uma teoria sociológica da religião. São Paulo: Paulus, 1985.
LESBAUSPIN, Ivo. Marxismo e religião. In: Sociologia da Religião – Enfoques teóricos. Petrópolis, Rj: Vozes, 2011.
MARX, Karl. “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel”. Marx, Karl e ENGELS, Friedrich. In: Sobre a religião. Lisboa: Edições 70, 1975, p.47-49. [Texto e escrito no fim de 1843 a Janeiro de 1844. Aparecido nos “Anais Franco-Alemães”. Paris, 1844. Segundo Karl Marx-Friedrich Engels: Obras, tomo I. Berlim, 1958].                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                       
__________. Manuscritos econômico-filoasófico e outros textos escolhidos: seleção de textos de José Arthur Giannotti. 2 ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Os pensadores).
REALE, Giovanni, ANTISERI, Dário.  História da Filosofia. Do romantismo até os nossos dias (Volume III). São Paulo: Paulus, 1990.
ZILLES, Urbano. Filosofia da Religião. São Paulo: Paulus, 1991.











[1] Filósofo pela UFPB (Licenciatura e Bacharelado), Teólogo pela Escola Teológica Ministerial da Arquidiocese da Paraíba, aluno de Teologia do Seminário Arquidiocesano da Paraíba Imaculada Conceição e graduando do 4º Período de Ciências das Religiões pela UFPB.
[2] Marx passa do idealismo hegeliano para uma práxis histórico-crítica, ou seja, uma dialética com “os pés no chão”. Essa expressão é para falar que Ele vai além de Hegel, pois pensa na praticidade da realidade e não em algo idealizado como sendo distante ou para uma realidade atemporal.